Os anos de Aprendizagem

Redobrava sua postura perante os desejos. A maneira de sentir algo de mais necessário, superior ao fisiológico sentir de sede. Toda a saciedade será companhia. Destronando cada instante dividido entre o inerte e o movimento, sua jornada era a fragmentação do desejo. Nada suscitaria viver tão ordeiramente, com a certeza de um terno prazer, sem intensidade e contínuo. Deveria então atirar-se para além do conhecido. Não fugia de si, endurecia-se, para elucidar tudo o que lhe fosse estritamente autêntico. Restou apenas o choro, e viu nas compostas lágrimas uma espiritualidade que esvaziava do corpo. Sim, a fé estava no corpo. Tratou logo de cultuar sua carne, que permitia enxergar as nuvens e os carros.
Corroído por um cintilante vazio, pôs a perambular por ruas antigas, casas falantes e céus inalcançáveis. Aos poucos via-se rodeado por uma indisposição vaga e alheia. Não era mais vívido que os outros, apenas rondava a uma presa, circulando e restringindo seus movimentos ao que lhe fosse fortuito. Vencia a mecânica pela dúvida.
Sugestões infinitas. A certeza no nada era redobrada. Ausente, inconstante. Distração era a força que movia os segundos sempre transformados. Sequer o problema mais relevante mantinha-se de pé quando confrontado pela sombra do sol, inclinando-se até uma nova estrela pairar acima das montanhas. Devia ser um castigo pensar e recobrar a própria vida, em características ridículas, avaliando sempre a própria realidade com critérios diferentes que tampouco catalogavam as sensações, o confronto entre o presente e tudo mais. Injusta noção de que o trágico é o imperador do mundo.
O aspecto de excepcionalidade era dúbio, alcançaria tons agudos somente em ocasiões de raridade palaciana? E se deleitava solenemente em toda ocasião de sofrimento, adversidade e escárnio feito pela sua própria gênese. Era o refinamento de um animal selvagem, no controle do sopro e da mordida, embebido de bestialidade e com a vocação de arrasar com a própria pele.
Sua alma era uma arquitetura disforme. Sem finalidade estética ou produtiva. Nada de prolongar a tradição funda e incoerente, perpetuada pela lógica fracassada de mortos esquecidos, herdeiros da memória escrita e inútil. Então, estava decidido: encontrar doses de harmonia pelo caminho. As notas eram as mesmas, assim como a vida é a mesma. Nada de inédito durante os concertos, nada a ser descoberto ou feito. Vivia unicamente para sentir e compreender.
Tornando-se a coisa prometida, imagem que não compreendia num espelho nítido, ele evita as definições, rastejando sua liberdade até um desconhecido campo. Tudo o que semeia no âmago da solidão morre. Zarpar em outra direção, o encontro doloroso alheio que reúne suas malas para uma viagem insone de busca e comparação. Este que vê por alguns minutos é um verdadeiro.
Ofício muito complicado. Exigia precisão fina, amaciar a carne que era apreciada no jantar. Refazer as palavras com ódio para o deleite dos outros, ainda sem descobertas. O prazer detém-se na maciez das palavras novas, ainda sem significado compreensivo. A tarefa é difícil. Buscar com fidelidade o correto tom de viver. Outra preocupação lateral, sonhava mais uma vez a brincadeira da pracinha, areia nos pés, sol que cega a certeza adulta.
O sol asteca é o mesmo, cruza o mar atrás da montanha. Insaciável, se desdobra por intuição e calor. Sua visão enervante era completa. A natureza não é vazia, fútil, limitada. Viveria pela grandiosidade de ser, sem tomar o tempo como sua responsabilidade. As palavras seduzem como esse sol. A virtude está em ver essa igualdade.
Vou imprimir, ler, reler, grifar de amarelo, reler de novo de novo e de novo e volto pra fazer outro comentário.
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