O Inferno

Quando um sonho confunde-se  com a realidade é lá que concentro meus esforços. É uma imersão entre aquilo que se sente e aquilo que se é.


Um dia acordei fora de mim. Não estava em minha cama como de costume, não vestia meu moletom cinza nem meu casaco vermelho do natal passado, não estava em meu próprio corpo. Eu flutuava em um grande vazio laranja. Era agoniante e aterrorizador estar a deriva e no vazio, sem perspectiva de encontrar algo, mas ainda assim, sentia uma tola e infantil esperança. Morrer pra mim era uma ideia impossível naquela situação.

Eu tentava respirar porém em vão, meus pulmões não existiam mais. Era só uma alma sem corpo, um fim trágico. Permaneci por horas naquela agonia, até perceber que talvez não fosse um sonho, e voltei a me desesperar e perder o controle novamente. Algo mudou e eu tinha retornado a um plano físico.


Era tão ruim quanto o primeiro estágio. Eu sentia muito frio naquele planeta inóspito, sentia cada fio de tecido do meu corpo atrofiando pelo gelo. Mais uma vez a morte ecoava por meus pensamentos, agora um pouco mais real.

Após mais uma sessão de terapia cósmica eu me encontrei em um local quente. Tão quente que minha pele começava a derreter. Eu tentava a todo custo desmaiar, porém era impedido de perder a consciência.

Depois de mais algum sofrimento, ganhei extensão. Agora tudo possuía um tamanho diferente do meu, e tudo era exageradamente pequeno, não podia nem tocar em uma nuvem ou balançar uma árvore. Ainda era muito impotente.

No outro momento eu era tão pequeno que até os átomos me pareciam do tamanho de uma montanha, ninguém podia me ver e era mais insuficiente.

Mais uma camada me foi adicionada. Agora eu podia ouvir. Porém, tudo  e todos eram bocas. Não conseguia me concentrar por todos falarem ao mesmo tempo. Não consegui entender ninguém e isso me entristeceu.

Logo após isso fiz um pedido, que foi atendido, e tudo se transformou em ouvidos para finalmente poder falar. Mas agora eu que não tinha boca! Ninguém podia me ouvir. Chorei mais uma vez.

Era tanta tristeza que mudei minha cabeça, cogitei morrer em meus pensamentos. Tudo mudou pela última vez e me vi em um espaço vazio e branco e ouvi passos, um homem alto e bem vestido me cumprimentou. Era Dante Alighieri com sua risada angelical. Ele olhou no fundo dos meus olhos e disse que eu estava pronto pra viver no inferno, que era só dar mais um passo e tudo estaria consumado. Me assustei um pouco, mas prossegui.

E então, eu nasci.

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